O despertador velando os nossos ouvidos
de dez em dez minutos. Os dedos munidos de incansáveis e regurgitáveis e
repetidas mensagens de bom dia. O seu café temperado com canela
anunciando oito horas de sono, quase nove. Meu corpo abandonado nessas
madrugadas enfrentando a insônia, num cortejo inútil para amansar a
solidão dos pés.
O que não tivemos, porque fomos
interrompidos. As festas que frequentaríamos, eu estrangulando a sua
mão, pra que seu amor não me escapasse. As viagens que não planejamos.
Aviões no céu, todos eles, que flutuam na linha da vida que você me
roteirizou e cremou, como se cansado da brincadeira.
Eu vou me lembrar de você sempre que for
surpreendida por uma parede colorida por porta-retratos e me dilacerar
com uma dúvida: quanto tempo depois você se livrou da insignificância da
minha foto coroada ali. Toda vez que topar com qualquer peça de roupa
enterrada nas gavetas e que foi parar ali um dia só pra chamar a sua
atenção. Do quanto você me achava insuportavelmente bonita. E do quanto
eu me fazia bonita, só pra agradar.
Uma multidão ao nosso redor, você com um
presente nas mãos. O nome do taxista que guiava por São Paulo quando
você descansou no ombro esquerdo a cabeça e seu olhar incendiado de uma
ternura piegas me enquadrou eternamente. O perfume que você me deu –
ainda é dolorido me vestir com nosso cheiro – e que escondi de minhas
recaídas noturnas e dramáticas, que todos já preferem ignorar.
Palavras atrevidas enjoando o peito. A
eternidade de um beijo. Um tropeço do coração. O corpo anestesiado de
uma alegria, que hoje repousa cinza dentro de alguma urna do meu
passado.
Silêncios repentinos vão me lembrar
você. Uma porta batendo na minha cara. Um telefone desligando sem adeus.
Aliás, qualquer adeus. Todo “até logo” banal que ainda vou sofrer.
Perguntas não preenchidas. Mentiras. O que você completou, enquanto eu
só conseguia sorrir.
Por Priscila Niconielo
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