sexta-feira, agosto 24, 2012

Num Choro


Por André Lenz

Um choro o trouxe à vida. Não um choro qualquer mais um choro ouvido de longe, por todos os cantos e celebrado unicamente por um sorriso, um carinho. Os passos, o cair, o levantar, o afago lento em toda sua inocência foi sentido e vigiado, não por homens, não por corpos, não por almas, por luzes. E a cada raio de sol cintilante em seus cabelos trazia um brilho ofuscante somente apagado pelo brilho do seu olhar.
Mas a vida foi cruel. Vida essa que por muitos momentos teve que viver sozinho regado em lágrimas perdido no escuro de um canto vazio ouvindo, às vezes, a batida do coração quebrando todo aquele silêncio. Mas preferia assim. Mal sabia que os cantos escuros dessa vida só o fariam aprender a brilhar.
Nos passos largos e curtos de uma jornada incompreendida foi aprendendo, foi buscando e tentando encontrar um lugar de paz. Foi tentando achar um espaço no mundo que pudesse ser chamado de seu e onde pudesse ficar somente quieto. Pedras caíram em seu teto, ventos destruíram seu jardim, chuva apagou seu fogo, mas numa motivação vinda do interior aprendeu a seguir em frente. Aprendeu a olhar somente as coisas boas da vida e tirar proveito das coisas ruins. Aprendeu a ensinar. Aprendeu a ouvir. Aprendeu a entender. Aprendeu a ser muito mais do que um simples ser humano. A fazer a diferença, mudar o mundo. Não todo ele, mas pelo menos ao seu redor. Fazer o bem sem esperar nada em troca, respeitar aos outro mais do que a si mesmo, ser uma rocha, uma daquelas onde alguém pode descansar e tirar, às vezes, o peso que machuca as costas, aliviar o sofrimento, compartilhar.
A verdade é que quando se achava simples era o momento que demonstrava a maior complexidade. Seu lugar no mundo nunca fora decidido. Seu refúgio não havia sido encontrado e, assim, por muito tempo passou despercebido e apagado, sem um sorriso no rosto que pudesse ser visto. Não entendia o mundo. Estava perdido, mas na verdade, precisava entender a si mesmo.
O tempo foi passando rápido e um dia parou cansado de tudo e olhou para cima, para as estrelas, para lua, para o céu, para si e se encontrou. Conseguiu enxergar no céu o reflexo de sua alma e entender que os paus e pedras e todas as tempestades eram apenas um único e simples aprender. Acordou renovado, sabendo seu lugar no mundo, respostas à perguntas antes que não paravam de persegui-lo. Cheio de vida, profundamente afogado num mundo perfeito de amor que não era vivido, mas construído. Acordou e sentiu a luz.
Daquele dia em diante, entendeu que deveria deixar um rastro. Deveria deixar em cada um que passasse ao seu redor o sentimento de algo bom. Deveria dar paz para encontrar a sua. Carinho para receber o seu. Bondade para ter de volta e sempre pagar o mal com um sorriso, com atitude, com amor.
Passou a mudar e crescer, passou a ter flores, borboletas, brisa e orvalho. E agora o que se percebia eram lindas canções sempre diferentes compostas por belas aves que se ouviam de longe a cada passo aleatório que dava. O céu, às vezes, desabava em água, mas era uma chuva sempre noturna nunca vista por olho algum. Algo meio mito, meio lenda. Mais compreendido não como a falta de alguma coisa ou um algo ruim, pelo contrário, a chuva era uma chuva boa que limpava a alma e que servia para descarregar não o peso daquele céu, mas sim o peso de todos as cargas recebidas e retiradas. Era a chuva do ser. Era um choro de anjo.
Sua luz se tornou intensa. Por terras e terras foi contada a lenda e por gerações se espalhou o mito que sempre foi conhecido por não ser desse mundo, mas sim colocado no mundo de uma forma apagada e simples para viver uma jornada de ensinamento que o fez irradiar o brilho.
Um dia se foi. Um dia apenas completou sua missão e partiu para bem longe. Partiu de volta para seu lar e levou consigo um pedacinho de cada coração que pôde adentrar. Levou consigo os sorrisos, os abraços, os olhares e sentiu então, que sua luz brilharia de uma forma diferente. Sentiu que agora cada pedacinho de coração havia sido substituído por um pouco da sua luz e então ele não precisaria mais brilhar, os outros brilhariam por ele.
Num choro nasceu, num choro se fortaleceu e num choro se foi, deixando saudades por onde passou mas com a certeza de que sua missão não foi em vão e agora mora no coração de cada um para enfim apenas descansar e aproveitar da paz que tanto buscou.

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