sábado, junho 23, 2012

Casados em casas separadas

Cláudia e Paulo estão casados há dezoito anos e separados por 600 metros

Por Carina Martins

A telefonista aposentada Cláudia Madalena Pinto Soares, 44, se casou cedo, antes dos vinte anos. Foi o que ela chama de um “casamento tradicional”. “Mas não deu certo”, diz. O casal chegou a ter dois filhos, mas acabou se separando de forma não muito amigável em 1990. “Fiquei dois anos sozinha e não queria outro casamento. Queria resolver meus problemas, não arrumar mais”. Com dois empregos e duas crianças pequenas para cuidar, Claudia não tinha tempo para relacionamentos. Até um baile de Carnaval em 1992, quando conheceu Paulo. “Uma das primeiras coisas que ele falou para mim foi que não tinha pretensões de casamento, porque era o único filho solteiro, morava com os pais e queria continuar cuidando deles”, diz Cláudia.

Um romance de Carnaval com um solteirão declarado não era exatamente material para alimentar contos de fadas. “Era uma coisa sem expectativa, porque eu também não estava procurando nada. Queria me resguardar em função dos meninos pequenos, não queria um estranho dentro de casa”, diz. Mas ao mesmo tempo em que não queria `pular de cabeça´, a ideia de algo totalmente sem compromisso a incomodava um pouco. “Tenho filhos, não podia me dar ao luxo de ficar trocando de namorado como quem troca de calcinha”.
Logo os dois descobriram que moravam na mesma rua, a uma distância de 600 metros um do outro. Começaram então um namoro à moda antiga, uma relação de visitas. “Ele vinha em casa e jantávamos todos juntos, e a mesma coisa na casa dele. Aliás, na casa dele eu sou até hoje exatamente uma visita, porque encaro como a casa da mãe dele”.
Deu certo
O tempo foi passando, a relação ficando mais sólida. Às vezes, ele perguntava sobre o arranjo, se iam continuar assim, se ela estava bem. Estava. “Não foi uma coisa premeditada. Foi acontecendo. Modifiquei minha casa, ele tem as coisas dele aqui, passa os finais de semana ou quando tem vontade. Não sei dizer se foi comodismo, mas se é cômodo é bom, não é?”, reflete.
Claudia diz que as relações dela com os filhos e dele com os pais foram fundamentais para que eles mantivessem o arranjo ao longo dos anos. E que, para eles, foi importante não misturar as coisas. Paulo ajuda com a criação das crianças e tem uma relação de afeto com elas, mas ela não o considera um padrasto. “Ele tem todos os cuidados com eles, quer saber que horas chegam, vai buscar, tem afeição. Contribuiu muito com a criação dos meninos. Mas nunca fez a linha paizão. O relacionamento dele é comigo. Se tivesse que dividir educação dos filhos para mim seria um pouco complicado”. A mesma coisa acontece com os sogros. “Eu vejo ele muito protetor com os pais. Ele perdeu o pai há três anos, e a mãe precisa dos cuidados dele”.

Arquivo pessoal
Cláudia e Paulo comemoram sua união
Além de terem que lidar com essas questões emocionais, se morassem juntos ela diz que haveria também complicações práticas. “Eu o classifico até como chefe da família, ele me ajuda. Mas, se morássemos juntos, ele teria que sustentar duas casas. É um complemento pra minha vida, mas não dependo dele, não é brincar de casinha. Ele tem a casa dele própria, eu também. É melhor assim”. Romance
Tudo muito prático, mas onde está o romance? E, principalmente, quando foi que esse namoro virou casamento? As duas respostas se misturam. O arranjo deu tão certo que, antes de perceberem, o casal completou dez anos juntos. Foi então que Paulo começou a trabalhar em uma empresa que oferecia alguns benefícios aos companheiros. “Ele veio falar comigo sobre isso, e começamos a brincar, a conversar”. O resultado foi que aproveitaram mais uma vez uma questão prática para celebrar seu amor. “Juntamos os amigos, fizemos como se fosse uma festa de casamento mesmo, muito bonita, viajamos como se fosse lua-de-mel. Mas continuamos tudo exatamente como estava”, conta Claudia.
A rotina dos dois é em casas separadas. Aos finais de semana, ele sempre dorme com ela. Na casa da sogra ela não dorme nunca, por respeito. Mas se Claudia faz uma comida diferente, dá vontade de dividir e ele é convidado. Quando ligam para a casa dela atrás dele, as crianças anotam o recado. “Não tem nada disso de que não mora aqui”. Os dois viajam e passeiam sempre, e saem também com sozinhos com amigos. “Só não podemos sair sozinhos para noitada, é nosso acordo, para não dar motivo de ciúme”. E Claudia confirma a ideia difundida de que, com um pouco mais de privacidade, fica mais fácil manter o romance. “Dezoito anos depois e ainda somos como namorados. Ele me chama para ir ao cinema e eu me arrumo e o espero. Você fica sempre com aquele entusiasmo, cria um clima diferente daquele do dia a dia.”, acredita.
No fim, o segredo parece não ser diferente do de todos os casamentos. “Eu vejo muitas amigas com família em que todos moram juntos e a casa é só uma referência para correspondência e um lugar para trocar de roupa. Um casamento tem muitas coisas para partilhar. Ele passou por três grandes cirurgias desde que nos conhecemos, e em todas fui eu quem cuidou dele. É cheio de manias e temos muitas diferenças. Mas, para dar certo, um tem que se adequar ao outro fazer concessões”. Ela adora praia, ele ama serra. No verão, ele a acompanha, no inverno é a vez dela.

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